terça-feira, 23 de outubro de 2007

Encontrando problemas ambientais

Quando cheguei aqui, comecei a procurar disciplinas para fazer. Não há porque fazer isso, por dois motivos. Primeiro, eu já tenho os créditos necessários para conseguir o título de doutor, e a estratégia mais adequada para chegar ao fim dessa tortura é a QSP (quantidade suficiente para...), ou seja, fazer apenas o necessário e não o desejável. O desejo de todo mundo que faz doutorado é aprender tudo o que puder... o que não é possível. Segundo, estou aqui como visitante, o que não me habilita a cursar disciplinas.

Mas uma coisa é a regra e outra coisa é ser brasileiro. Eu sempre tive vontade de cursar uma disciplina de estatística em um doutorado daqui. Não que as disciplinas no Brasil sejam ruins ou fracas. Apenas tem outra abordagem para a coisa. Eu queria ver o outro modo de ensinar e aprender deles.

Tentei por tudo encontrar uma disciplina de estatística por aqui. Não que as disciplinas mais teóricas não sejam importantes. Mas posso baixar os artigos ou ler na biblioteca e tirar minhas próprias conclusões. Não encontrei nenhuma disponível: na sociologia, o professor vai entrar em sabático, na psicologia, eles só vão oferecer no inverno, na economia, eles estão com a turma cheia (20 alunos), e assim por diante... Meio que por acaso, me mandaram uma oferta de uma disciplina de "estatística espacial", pasmem, na faculdade de estatística. Não queria fazer aulas na estatística por uma série de motivos: minha formação matemática não é tão sólida assim (a última integral de que lembro foi uma farinha integral que usei para fazer pão...), e os estatísticos muitas vezes "babam na gravata", quer dizer, têm um conhecimento tão avançado que nós, meros mortais, não conseguimos aplicar em absolutamente nada de útil... enfim, nossos probleminhas banais de negócios.
Fui lá, muito humildemente, e pedi para assistir como ouvinte. Os professores deixaram, e lá estou eu indo às aulas. São três alunos: dois da matemática aplicada e eu, patinando para entender a notação matemática... não lembro direito nem como se chamam as letras gregas (uma heresia para eles).

Primeiro exercício: o professor pegou uma base de dados de árvores em três estados americanos (Pennsylvania, Virginia e West Virginia). Eu fiquei com a Pennsylvannia. Nossa missão: encontrar padrões irregulares de ocorrência de maples vermelhos (Acer rubrum). Essa árvore tinha uma incidência razoavelmente baixa nos estados americanos do norte antes da colonização européia, e agora têm incidências mais altas. No meu estado, o red maple até era a espécie dominante, mas tinha 20% de incidência. Hoje é 22% de todas as espécies. Empregamos uma técnica chamada spatial scan statistics (estatística de varredura espacial) para identificar áreas onde a ocorrência da espécie é anômala. Depois de obtidas essas áreas, pudemos utilizar um sistema de informações geográficas (GIS) para sobrepor outros mapas e tentar imaginar o que estava acontecendo. Eu achei, por exemplo, uma estranha coincidência entre áreas de mineração de carvão no estado, e zonas de preservação ambiental, com essa ocorrência fora do normal.

Ainda estou engatinhando nesse tipo de técnica, mas achei incrível o poder que ela tem para identificar "focos" de fenômenos estranhos. Bem, ela foi desenvolvida inicialmente para identificar focos de câncer... as aplicações em outras áreas do conhecimento são inúmeras: é só ver o site http://www.satscan.org para ficar de queixo caído: criminologia, estudos de desenvolvimento regional, na área florestal, da saúde, meio ambiente.

Mais uma ferramenta para a maleta... Talvez eu não use essa na tese, mas quem sabe um dia... talvez nem sempre a QSP seja a melhor estratégia. Talvez exista vida depois do doutorado.

***

Abaixo, um dos mapas que obtive com a técnica. Dá para ver bem claramente uma área ovalada, ao norte do estado, onde a ocorrência é anormal. Outras análises que eu fiz encontraram focos menores, em que a ocorrência de red maple chega a 44%, o dobro da média estadual.

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