domingo, 25 de novembro de 2007

DSI - Técnicas de Ensino

Houve 3 momentos durante o DSI em que recebi idéias interessantes para atuação como professor, e vou registrá-las aqui.

Sessão de Ensino no Consórcio Doutoral

Como já havia dito em outro post, houve uma sessão de técnicas de ensino dentro do consórcio doutoral. O nosso professor, Harvey Brightman, é aposentado pela Georgia State University, e segue dando aulas no MBA executivo lá.

O Harvey é professor de estatística. Como parte de nós que já pisamos em uma sala de aula como professores, imagino que ele deve ter sofrido com a dificuldade dos alunos de entender o conteúdo. Acho que os professores se dividem em dois tipos: os que sofrem com isso e tentam melhorar sua técnica, e os que acham que os alunos são burros. Ele parece ser do primeiro tipo. Então, ele começou a ler, muito tempo atrás, sobre educação de adultos. Sua aula desse sábado começou com isso.

Só que ao invés de apresentar os números, ele colocou uma lâmina com lacunas ( ____ ) ao lado de cada atributo do professor (domínio da matéria, clareza do conteúdo, etc.) e foi pedindo para a gente estimar a importância de cada atributo para o aprendizado do aluno. Eram 17 atributos, e ele pediu que cada um dissesse qual é o mais importante e os participantes iam dizendo , por exemplo, "conhecimento do assunto" e ele dizia "esse é o número 9, em importância", segundo um estudo feito nos Estados Unidos e publicado em 1989. Ponto número 1: organização da disciplina e da aula; número 2: clareza da apresentação. Ele disse uma coisa interessante: nós, professores universitários, somos a única profissão que não recebe qualificação formal para exercermos nossa profissão. Seria como fazer cirurgia cerebral por intuição, diz ele. Todo mundo que teve aulas de didática sabe do que estou falando...

Ele mostrou como organizar a aula com um exemplo... de como não organizar! Ele mostrou umas aulas de marketing de um outro professor do qual ele fez o "coaching". Ele trabalha (pelo que eu entendi, até hoje) na universidade como coach, ou seja, "treinador" de professores. Segundo ele, é mais gratificante ser coach de ensino do que de pesquisa, porque demora 3-4 anos para alguém se tornar um bom pesquisador, enquanto ele diz conseguir tornar alguém um bom professor em 7-8 semanas. As aulas que ele trouxe de exemplo começam com conceitos (marketing é isso, brand equity é aquilo...). Os alunos saem do ar quando vêem esse tipo de coisa. A clássica estrutura de começar com a definição, depois ir para a teoria e finalmente mostrar a aplicação é o contrário da forma com que um adulto aprende. Ele começa com um problema (aplicação) e depois busca como resolvê-lo (teoria). Bom, não preciso dizer que... sim, minhas aulas eram organizadas da maneira "errada", que ele chama de modelo TA (teoria -> aplicação), ao invés de AT (aplicação -> teoria).

Depois de mostrar o exemplo do seu colega do marketing, Harvey apontou então o que ele chama de "big five" - os cinco princípios básicos de suas apresentações:

  1. Começar dizendo porque o assunto é importante -> depois ir para o tópico
  2. Partir de um exemplo concreto -> teoria (modelo AT)
  3. Partir de um material familiar ao aluno -> depois ir para o desconhecido
  4. Começar com a versão simples -> depois partir para a complexa
  5. Apresentar a mesma idéia em múltiplas linguagens (palavras, figuras, símbolos, gráficos, equações)


Eu tinha outra dúvida e a aula dele me ajudou. Quando eu fiz minha graduação, os professores escreviam tudo no quadro, ou ditavam. Na verdade, eu, já naquela época, achava uma tremenda perda de tempo ficarmos copiando coisas ao invés de efetivamente estarmos discutindo ou tirando dúvidas. Hoje os alunos ficariam furiosos se eu, como professor, insinuasse fazer tal coisa. Mas ao disponibilizarmos as lâminas com a aula toda previamente para os alunos, eles não têm "surpresas". Uns três anos atrás, eu estava dando uma aula e eu tinha uma lâmina com uma questão para discussão. Na próxima lâmina, havia meus comentários a respeito. Em uma sessão "normal", em que os alunos não tivessem o material, não haveria problemas, mas meus alunos todos tinham cópias das lâminas... resumo: não houve discussão nenhuma - eles já sabiam minha opinião... Outro problema é que os alunos parecem não prestar muita atenção na exposição, afinal eles têm todo o material.

A solução para esses problemas é extremamente simples: ele chama de "notas guiadas". Ou seja, ao invés de colocar as lâminas com todo o material, ou não usar lâmina nenhuma e mandar eles tomarem nota no caderno, fazer lâminas com lacunas em certos pontos críticos ou largas áreas em branco nos locais onde queremos que eles tomem nota. Isso faz com que eles aprendam pelo efeito mecânico de copiar, pelo fato de estarem atentos, e pelo fato de terem depois suas notas organizadas.

Finalmente, como a mais maravilhosa apresentação/aula expositiva não funciona isolada, ele apresentou o método TAPPS (thinking aloud paired problem solving - solução de problemas pensando alto aos pares). Não adianta o professor falar a aula inteira. Todo mundo sabe isso. Se o professor fala a aula toda, tudo o que ele consegue é ficar rouco. Os alunos não sabem nada no final do período, muito menos na aula seguinte - quem dirá para a vida toda, como se quer. O TAPPS, segundo ele, respeita os dois tipos de alunos: o introvertido, que aprende pensando quieto, e o extrovertido, que aprende falando. Então, o método dele consiste em formar duplas. Ele coloca um problema para discussão. Todos têm que ficar 2-4 minutos quietos, pensando. Então, um da dupla têm que explicar para o outro, por 4-8 minutos. Apenas um da dupla explica. O outro escuta, faz perguntas e expressa suas idéias. Ao final, fazem um fechamento. Fizemos um exercício em aula, e pareceu bem interessante.

Jogos para o Ensino de Operações e Logística

Em outra sessão, fizemos um jogo. Era uma sessão promovida pela Responsive Learning Technologies (http://www.responsive.net/), em que eles estavam apresentando um dos produtos deles. Eles têm 2 jogos, um para o ensino de produção (controle de estoques, gerenciamento da demanda, gargalos, gestão da capacidade e da utilização) e outro para o ensino de logística (relacionamento entre clientes e fornecedores). Jogamos o primeiro. Pelo que entendi, o jogo é todo configurável. Cada configuração permite aos alunos/jogadores aprender uma coisa diferente, o que é bom. Como o jogo é pela internet, o professor pode escolher se os alunos vão formar times, vão jogar individualmente, vão competir entre todos em um mesmo laboratório na universidade ou vão jogar em casa. Enfim, é bem bacana. Eles têm versões em várias línguas, mas ainda não em português. Mas se mostraram interessados. Talvez seja uma coisa interessante se uma (ou mais, por que não?) universidade brasileira contatasse essa gente para disponibilizar para seus alunos os jogos.

Éramos todos doutores ou doutorandos de produção na sala. Havia uns 20, acho. Formamos uns 6 times e competimos entre nós. Nós, que entendemos um pouco do mecanismo da produção e não estávamos "competindo" para valer, ficamos emocionados quando víamos nosso time ficar em primeiro no ranking, imagina a emoção (e o interesse) dos alunos. Achei muito bom.

Exercícios Dinâmicos

Um problema que temos agora nos tempos de editores eletrônicos de texto, emails e comunicação instantânea é o da autoria dos trabalhos. A situação é a seguinte: o professor pede um "tema de casa", como fazer os exercícios do final do capítulo do livro-texto, ou qualquer bateria de exercícios que ele tenha disponibilizado. Semana seguinte, ele recebe uma tonelada de exercícios impressos no computador, e tem que corrigir todos. Bom, esse problema é velho. O novo problema é saber se foi o aluno mesmo quem fez ou se ele apenas recebeu de um colega, mudou a formatação e entregou. A solução apresentada pelos professores Hender e Heizer é interessante. Eles são autores de um livro-texto famoso na área de operações. Eles montaram um site de apoio ao livro, onde os alunos ganham uma senha individual. O professor monta um pacote de exercícios para os alunos fazerem. Os alunos preenchem online. Cada aluno recebe um exercício personalizado (dinâmico), único. Ou seja, se alguém quiser fazer para os outros, vai ter que entrar na senha dos colegas, resolver os problemas deles... enfim, coíbe um pouco a "cola eletrônica". A outra vantagem é que, no final, o professor tem as notas de todos "passada a limpo", sem ter que corrigir nenhum trabalho em casa. Afinal, já basta o trabalho de preparar a aula... Bom, eles estão aplicando até prova dessa forma. Não há como colar, certo? No fim, as notas estão prontas para serem entregues, sem tortura no final de semana.

Pareceu bem legal, mas tem um problema. Obviamente, está só disponível em inglês. Nem o livro deles tem tradução para o português. Ficou, para mim, a idéia de fazer os exercícios dinâmicos em excel mesmo. Não parece uma coisa do outro mundo. A desvantagem é que não vou ter as notas deles passadas no caderno ao final, mas isso é outro problema.

Aliás, tudo isso fica para depois do fim do doutorado. Um amigo, durante o evento, me perguntou porque eu estava tão interessado em ensino, e não em pesquisa. Não se trata disso. Eu apenas acho que não existe nada mais gratificante do que terminar uma aula, ou um semestre, em que os alunos gostaram e aprenderam.

Um comentário:

gustavo uriartt disse...

Adorei ler esse "post"... na semana passada apliquei provas para meus alunos... que decepção... nenhum deles foi capaz de interpretar um texto técnico. A pergunta era facilmente respondida lendo o texto... foi uma ducha fria. Mas não vou desistir. Ganho na insistência, mesmo sabendo que fomos o 52 lugar no PISA (de 57 Países) um dos piores desempenhos em Ciências (Física, Biologia e Química) uma tristeza...